Há poucos dias foi divulgada a nova edição do Digital News Report, publicada pelo Instituto Reuters em parceria com a Universidade de Oxford, que revela uma transformação profunda e contínua no modo como o público global se informa dentro da comunicação digital.
Ao todo, o estudo, realizado entrevistando profissionais e público geral de 48 países em todos os continentes, publica atualizações sobre o consumo de mídias digitais. Ele mostra em sua nova edição que o consumo de notícias nunca esteve tão fragmentado e segue em mutação acelerada. Anteriormente, em pesquisa de 2024 sobre confiança jornalística, o cenário já era prenunciado. A edição recente indica que redes como YouTube, Instagram, TikTok e X (ex-Twitter) passaram a desempenhar papel central no conhecimento de informações. A Rede JP traz os principais apontamentos globais detalhados para você por região.
América Latina e o Brasil: Redes em ascensão e polarização crescente
A América Latina dentro do relatório é protagonista da transição para um modelo orientado ao recebimento por redes sociais. Enquanto o levantamento traz apenas apontamentos gerais sobre o continente, sem dados elencados de outras nações, o Brasil é frisado, aparecendo no topo da lista global, com 35% da população usando as redes sociais como principal fonte de notícias. O crescimento é expressivo desde 2013, quando esse número era inferior a 10%.
O recorte teve uma oscilação durante a pandemia, onde devido a novidade da COVID, a população procurou evitar se informar por redes por atualizações da doença e vítimas, em uma espécie de refúgio. A partir da vacinação, o índice voltou a subir com os números englobando uma recolocação da população brasileira perante a vontade se noticiar de novo de forma mais imediata.
O equilíbrio entre consumo de influenciadores digitais e de produções de mídia e jornalistas compartilhadas em redes são ainda fortes no país e na América Latina como um todo, sendo mais balanceado em vista de outros continentes. A desinformação, impulsionada por políticos e criadores, é um fator de preocupação, apesar da maioria do público ter respondido fazer checagem em mais de um veículo, o que desfaz maiores chances de desinformação em massa no Brasil comparado a demais países.
África: vídeos dominam sobre a leitura: tendência audiovisual
Na África, o consumo de vídeos como principal formato informativo se destaca. Com maior acesso a dados móveis e menor índice de leitura especializada jornalística, redes como YouTube dominam. Dentro do relatório, no Quênia, por exemplo, mais de 50% da população utiliza a plataforma semanalmente para se informar. A confiança na informação, no entanto, é um desafio. 73% dos entrevistados africanos afirmam ter dificuldades em diferenciar fato de boato, mostrando a fragilidade ainda grande do continente em diferenciar o fato do fake muitas vezes.
A influência dos criadores digitais é central, mas também problemática. Na Nigéria e no Quênia, mais da metade dos entrevistados vê influenciadores como fontes recorrentes de desinformação. Apesar disso, o jornalismo local e periférico é forte: criadores locais vêm ocupando espaços antes dominados por rádios e televisões, inclusive participando destas mídias. O crescimento de canais de YouTube e perfis no TikTok oferecem uma cobertura mais próxima da realidade cotidiana em regiões mais periféricas, o que explica esta tendência.
Ásia: Tiktok explode e criadores desafiam a tradição
A Ásia é hoje um dos epicentros da transformação digital no consumo de notícias, de acordo com o levantamento. A Tailândia teve o maior salto do mundo: sua população agora utiliza o TikTok como principal meio de informação — com criadores locais ganhando notoriedade e desafiando a comunicação estatal e tradicional. É um índice particular em relação a outros países, onde, embora tenham certa influência da plataforma, seu tamanho é mais pulverizado.
Na Índia e Malásia, o YouTube também desponta como veículo dominante. A tendência pode ter explicação geopolítica: já que o continente contém países com censura ou limitações à liberdade de imprensa, onde criadores digitais funcionam como canais alternativos e mais próximos. Pela plataforma e sua duração de conteúdo, a população asiática prioriza a urgência e a objetividade, mais imediatismos noticiosos sem espaço para grandes reportagens ou conteúdos extensos.
Europa: cautela e preservação a equilíbrio de credibilidade
Se na Ásia e na África o audiovisual de plataformas impera, na Europa, a transição é mais lenta e crítica. Países como Dinamarca, França e Reino Unido apresentam crescimento no uso de redes sociais para consumo de notícias, mas em patamares mais baixos. A França, por exemplo, tem 19% da população utilizando redes como fonte principal de informação, enquanto o Reino Unido chega a 20%.
Criadores digitais até ganham notoriedade entre jovens, mas a mídia tradicional ainda exerce forte influência. A confiança nos veículos de imprensa é mais alta que a média global, especialmente em países como Noruega e Suécia, onde também se destaca o número de pessoas dispostas a pagar por conteúdo jornalístico. A resistência ao uso de inteligência artificial para filtrar notícias também é maior entre europeus, com um equilíbrio geral acentuado entre adesão tecnológica e o tradicional.
Apesar de tudo se encaminhar bem por um lado, na Europa Oriental em específico o relatório evidencia uma perigosa convergência entre política, desinformação e redes sociais. Em países como Hungria, Sérvia e Bulgária, mais de 50% da população enxerga políticos como as principais fontes de conteúdo enganoso. Nesse cenário, criadores de conteúdo ocupam espaço misturando jornalismo, ativismo e opinião, com o formato do “jornalista partidário” sendo forte. Em alguns países, políticos banidos ou de mandato recém terminado vão para as redes e comandam podcasts. A fragmentação da mídia e a desconfiança em várias dessas nações ampliam a polarização política.
América do Norte e os EUA: mudança gradual e adesão a modernização
No Canadá, o consumo de notícias ainda se apoia em fontes tradicionais, mas há um movimento em direção à personalização digital. Plataformas de vídeo e ferramentas com inteligência artificial têm ganhado espaço, especialmente entre os mais jovens. Diferente dos EUA (que hoje têm 34% da população social-first — de consumo primordial por redes sociais —, os canadenses mantêm índices mais altos de confiança nas marcas jornalísticas.
Ainda assim, o padrão de fragmentação é visível: cresce o número de jovens que dizem se informar mais por redes do que por sites ou aplicativos noticiosos. Contudo, dentro destes países, a população mais velha e consumidora da mídia tradicional se diz consciente e aprendiz de redes sociais para se informar e conhecer outros métodos de se informar.
Oceania: redes ganham força junto à polarização
Na Austrália e Nova Zelândia, redes sociais como X (ex-Twitter) e YouTube têm crescido como fontes principais de informação. A rede X, por exemplo, teve um aumento de 6 pontos percentuais no uso para consumo de notícias.
A polarização política alimentada por redes é uma preocupação crescente, enquanto a televisão ainda resiste como principal canal entre os mais velhos. Diferentemente da América e EUA, a população arraigada na mídia tradicional pouco se mostra adepta a outras redes para conhecer ou ter a oportunidade de se informar, o que é um cenário atípico até dentro dos off-social — aqueles não inteirados em consumo de redes sociais —, que consomem fortemente e primordialmente a mídia impressa e a pesquisa por blogs (extra redirecionamento de redes) como fonte, em vez da TV.
A tendência global: redes e criadores são partes da nova era
Os dados mostram que 44% das pessoas entre 18 e 24 anos usam redes sociais e plataformas de vídeo como sua principal fonte de notícias. Apenas 22% preferem sites ou aplicativos de veículos jornalísticos. Isso confirma o avanço da “geração TikTok” e consolida o papel dos criadores de conteúdo no ecossistema informativo.
Em plataformas como o próprio TikTok e Instagram, os usuários prestam mais atenção a criadores do que a jornalistas. No TikTok, por exemplo, apenas 36% focam no conteúdo jornalístico tradicional, contra 49% que priorizam influenciadores e personalidades. A inteligência artificial também começa a impactar: Entre 5 a 7% da população global já usa chatbots, resumos automáticos — número que salta para 15% entre jovens abaixo dos 25 anos.
Conclusão: o jornalismo enfrenta seu maior teste. O Digital News Report 2025 evidencia que a disputa pela atenção, confiança e relevância do público está mais intensa do que nunca. Para sobreviver, as marcas jornalísticas precisarão se reinventar com agilidade: integrando vídeo, redes, IA e formatos acessíveis, mas sem abrir mão de credibilidade, profundidade, checagem e transparência. O equilíbrio entre ambos mundos ditará o futuro da comunicação mundial.