Temos trabalhado continuamente para colocar a comunicação no centro da agenda de direitos humanos, destacando-a como uma prioridade e não como algo secundário. Agora, mais do que nunca, fica evidente o motivo dessa urgência. A recente decisão de Mark Zuckerberg, CEO da Meta, de descontinuar a função de checagem de fatos em plataformas como Facebook e Instagram representa mais do que um retrocesso: um ataque direto à democracia e à integridade informacional. Tal medida abre espaço para a proliferação descontrolada de desinformação, discursos de ódio e campanhas de assassinato de reputação, impactando de forma desproporcional as comunidades negras, que já enfrentam exclusões históricas no ambiente digital e fora dele.
Para a Rede de Jornalistas Pretos, esse cenário é extremamente alarmante. No ambiente digital, o jornalismo tem se consolidado como uma importante fonte de renda e sustentabilidade para veículos e negócios liderados por profissionais negros. A desinformação tem sido uma ferramenta poderosa para deslegitimar tais lideranças negras, propagando narrativas que as desacreditam e silenciam.
Mais alarmante ainda é observar que, de forma assustadora, essa prática tem se manifestado dentro da própria comunidade negra, enfraquecendo, consequentemente, a luta coletiva e reforçando as estruturas de opressão. À quem perpetua esse sistema, fica o alerta: vocês também serão impactados pelas portas abertas por Mark Zuckerberg!
Esta dinâmica é agravada pelas práticas coloniais ainda presentes no ambiente digital, que intensificam as desigualdades estruturais. E conscientes dessa realidade, realizamos, em 2024, o curso “Diversidade, Inclusão e Novos Formatos no Jornalismo Pós-Cultura Digital”, que reuniu renomados especialistas nacionais e internacionais para discutir as transformações tecnológicas e seus impactos na comunicação.
O objetivo da iniciativa foi sensibilizar a sociedade civil sobre a importância do jornalismo para a democracia e capacitar profissionais para enfrentar e compreender as desigualdades invisíveis e a desinformação. Os resultados foram os melhores: apresentamos soluções, compartilhamos experiências internacionais e iniciamos diálogos que ultrapassam fronteiras. Concomitantemente, incentivamos jornalistas, comunicadores, estudantes e integrantes da sociedade civil a desenvolver suas próprias ações com base nos conhecimentos adquiridos no curso, mesmo sabendo que a verdadeira transformação requer articulação política e estratégias contínuas, muito além do hoje.
Foi com esse espírito que também criamos a Articulação pela Mídia Negra, em parceria com organizações comprometidas com a pauta racial. A iniciativa, já atuante junto ao governo federal, trabalha com incidência de políticas públicas que asseguram a equidade no jornalismo e fortalecem a atuação de profissionais negros em uma sociedade democrática.
Fomos catalisadores de avanços significativos, como a criação do GTI de Comunicação Antirracista e o lançamento do manual antirracista pelo governo federal. Entendemos que o jornalismo está no centro das disputas de poder e narrativas, e a comunidade negra ocupa, simultaneamente, os papéis de alvo e protagonista. Por isso, continuamos investindo na força das comunidades.
Atuamos em rede no Brasil, na América Latina e na diáspora africana, negociando com grandes empresas de comunicação, ampliando espaços para comunicadores negros e promovendo autonomia por meio da descolonização das práticas comunicativas. Nosso compromisso vai além de denunciar; ele envolve agir. Por isso convocamos a sociedade e o governo a se unirem contra o racismo estrutural e a desinformação, implementando soluções que garantam a equidade informacional. A Rede de Jornalistas Pretos não se limita ao que se espera; ela responde ao que é necessário.
A Rede de Jornalistas Pretos reafirma seu compromisso de combater o discurso de ódio e o racismo estrutural, convocando a sociedade e o governo à ação. É urgente ir além do reconhecimento das desigualdades e implementar soluções efetivas, que garantam o direito à informação justa, liberdade de expressão e, por fim, amplificação das vozes negras em todas as esferas.
Editorial escrito por Marcelle Chagas, Pesquisadora Tech & Society – Mozilla Foundation; Alumni Clinton Foundation; Universidade Federal Fluminense; Columbia Women’s Leadership Network; Rede de Jornalistas Pretos pela Diversidade na Comunicação; Observatório de Gênero, Raça e Territorialidade na Ciência; e Articulação pela Mídia Negra.
Texto feito por Marcelle Chagas, edição final por Kelvyn Araujo.
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