Desde os primórdios da imprensa e com a constante globalização, a presença rondante da pergunta e temática: “os temas que precisam estar e são tendências do futuro do jornalismo” estão por aí. Contudo, mais que propriamente o assunto em si, é importante analisar o olhar de quem está disposto a respondê-lo. Se não com exatidão, ao menos utilizando parâmetros cruciais de análise ao redor do que a comunicação evoluiu, vêm fazendo e poderá proporcionar.
Sabendo disso, a Rede Jornalistas Pretos no encerrar do ano de 2024 compilou alguns profissionais parceiros e questionou a eles de que forma eles vêem tendências na comunicação para o próximo ano e quais as mudanças almejam para o jornalismo. Ao todo, as respostas sinalizam não apenas uma visão aprofundada, mas de que forma os jornalistas enxergam a área na qual atuam e sobretudo, o que podemos, como comunicadores, fazer. Aqui, procuramos englobar distintos profissionais atuantes em várias vertentes, para compreendermos e juntos observarmos o que a comunicação jornalística pode ter — no olhar de quem está nela — para 2025.
O que podemos esperar do jornalismo no próximo ano por quem o faz
O que esperar do Jornalismo em 2025 na visão de Luis Alberto Alves: jornalista, autor dos livros “O flagelo do desemprego” e “Por que o meio ambiente é tão importante ao trabalhador” e atuante como profissional da área econômica e cultural, através dos blogs BlackMusicWorld e Hourpress.
Trazer o povo e valorizar conquistas
“A matemática é uma ciência exata. Mas infelizmente muito da grande imprensa, a serviço da elite, tenta transformar a situação de pleno emprego em tragédia. Muitas pessoas trabalhando aumentam o consumo, a produção e geração de empregos. É com esse cenário que 2025 vai pegar fogo no jornalismo econômico, onde atuo há muitos anos. Não haverá o valorizar das conquistas como redução do desemprego e mais investimentos da Petrobras e ao país e como as pessoas podem se usufruir do hoje. Trazer o povo ao centro do debate é uma tendência que precisamos ter. Em qualquer governo, a saúde da economia sustenta a democracia. Como formadores de opinião e na mídia independente, precisamos usar a internet e o espaço para melar o jogo do muito da grande imprensa. Claro, de forma responsável, como devem agir os bons jornalistas.”
O que esperar do Jornalismo em 2025 na visão de Antônio Junião, jornalista e comunicador integrante e fundador da Ponte Jornalismo.
Resistência e combate
“Sou co-fundador e diretor da Ponte Jornalismo, um site de notícias nativo digital, e minha fala vem nessa perspectiva. A Ponte cobre direitos humanos, justiça e segurança pública com foco nas violações cometidas pelo estado e seus desdobramentos, então denunciamos violência policial, encarceramento em massa, e demais violências estruturais de raça, classe e gênero que afetam principalmente a população preta, indígena, pobre e periférica em 10 anos de existência. Desde lá, mais de 100 pessoas presas injustamente sem provas já foram soltas com base em nossas reportagens. Nossas histórias já foram replicadas nos principais veículos do Brasil, no exterior e ganhamos alguns prêmios. E um dos impactos mais fortes que temos é que, a partir da nossa existência, a cobertura de segurança pública mudou no país. Hoje é possível ver veículos empresariais reconhecendo que existem problemas estruturais como racismo e violências de gênero e raça, assim como a violência policial, e dando mais espaço para cobertura de segurança pública do que davam antes (ainda é pouco). Isso só foi possível por conta do trabalho de veículos que tem no jornalismo de causas um compromisso as que tem essa linha mais combativa na área de direitos humanos, seguem ameaçadas. Seguimos ameaçados pela violência diária contra o nosso jornalismo, que sofre perseguições e ameaças institucionais via assédio judicial, e perseguições e ameaças físicas contra nossos jornalistas. Cito um exemplo: o repórter fotográfico da Ponte já levou um tiro de munição de borracha à queima roupa de um policial durante a cobertura de uma manifestação, tínhamos a identidade e provas contra o agressor, denunciamos, mas o caso foi arquivado sem mais consequências, o agressor ficou totalmente impune. E não só aqui no sudeste, temos relatos constantes de colegas jornalistas do norte, nordeste, centro oeste e sul, que sofrem todo o tipo de violência, principalmente em áreas afetadas por incidência do crime organizado, muitas vezes com a conivência e participação do estado. E somando a isso, existe toda a dificuldade financeira que temos para manter nossas organizações funcionando, ampliar nossa audiência, crescer financeiramente e conseguir incidir mais no debate público, pois não é barato fazer jornalismo de qualidade e manter profissionais trabalhando com dignidade, com estrutura. E para um futuro próximo, não vejo melhoras nesse quadro. Temos avanços, sim, temos e temos que mostrar um jornalismo muito mais voltado ao que as pessoas devem ter: dignidade e vida. O mais importante: com luta e coragem, sobrevivemos e vivemos até aqui, contra toda adversidade colhendo impactos do nosso trabalho. Mas não foi fácil chegar onde estamos, e sinto que no futuro, esse quadro também não se altere. Mas seguimos. E isso é o principal objetivo para os veículos. Seguir.”
O que Thiago Borges, jornalista e integrante do Periferia em Movimento, espera do Jornalismo em 2025.
A personalização e mediação entre mundos
“Uma tendência que espero e enxergo para o jornalismo em 2025 é a busca pela proximidade com a audiência em um período em que o público tem evitado o noticiário, a credibilidade está em queda e há outros atores que veiculam informação, não necessariamente comprometidos com a busca pela verdade. Essa busca por mais proximidade passa pelo uso de dados e da personalização de conteúdos. Mas pode ser uma faca de dois gumes. Ao tentar entregar aquilo que o público quer, muitos veículos podem deixar o compromisso jornalístico de mediação de realidades e a relevância de lado para dar vazão ao que é de consumo rápido, muitas vezes superficial. Por outro, devemos ver um avanço do uso da IA deve ser utilizada para fazer essa personalização – seja na adaptação de um mesmo conteúdo para diferentes públicos ou para apoio na elaboração de pautas. E em outra ponta, a proximidade passa pela humanização da profissão. Nesse sentido, acredito que veículos territorializados, de periferias, favelas, do campo e das aldeias, têm uma vantagem competitiva em relação aos meios tradicionais pois isso está na essência dessas mídias. Então, é interessante verificar a atuação dessas iniciativas também.”
O que Anderson Moraes, jornalista, editor-chefe e integrante do Jornal Empoderado, além de profissional na TV Fórum e conselheiro do EBC. visa para a área da comunicação jornalística em 2025.
O suporte ao independente preto
“A frase parece ‘cringe’, velha, mas o mundo está mudando constantemente e o jornalismo idem. Cada vez mais o jornalismo digital divide espaço com cobertura nos territórios. Outro ponto é que em 2025, se tenha mais políticas públicas para mídias pretas e periféricas. Que se discuta comunicação com quem produz na base, como fazemos aqui no Jornal Empoderado, pois não se faz jornalismo só no amor, precisamos de investimento financeiro e estrutura.”
O que a jornalista e editora do Ecos do Meio Rose Campos, espera para o ano de 2025:
O compreender e a importância de dentro e de fora do humanismo na comunicação
“A chegada da tecnologia expandiu o papel do jornalismo de forma significativa. A capacidade de disseminar informações rapidamente e a ascensão das mídias digitais mudaram a maneira como as notícias são consumidas. O jornalista passou a ser visto como um curador de informações, responsável por filtrar e contextualizar uma avalanche de dados disponíveis. Nesse contexto, a credibilidade se tornou um ativo essencial, especialmente em um ambiente saturado de desinformação. Pessoalmente, descobri, há alguns anos, que poderia me expressar através de artigos, transformando minhas inquietações em um meio de diálogo com o público. Para minha surpresa, o feedback foi tão positivo que me incentivou a continuar, mesmo quando a chegada da inteligência artificial me fez questionar sobre a minha capacidade de competir com esse novo cenário. No entanto, percebi que, ao invés de encerrar minha jornada, essa nova realidade me motivou a me aprofundar ainda mais no jornalismo, tornando-me uma fonte de pesquisa sobre um campo que tanto amo. Com a pandemia de COVID-19 a importância do jornalismo, como fonte confiável de informação, foi exposta e evidenciada, a sua relevância, a toda a sociedade. O nosso alivio, recompensa ou até orgulho, além de minha certeza, acima exposta, foi perceber com colegas, após a crise, que a demanda por notícias precisas e bem apuradas eclodiu. O desafio agora era manter essa confiança em um mundo onde a desinformação estaria se propagando rapidamente, exigindo que os jornalistas continuassem a lutar pela verdade e pela ética na cobertura de notícias. Um grande desafio! Outro aspecto crucial a ser enfrentado são as desigualdades no setor. Embora possa parecer contraditório, após a realização do primeiro censo do jornalismo brasileiro, ficou evidente que as métricas de sustentabilidade — ESG e ODS — revelam uma triste realidade: mulheres, negros e indígenas ainda ocupam posições periféricas ou se encontram na base da pirâmide da governança em empresas jornalísticas. Nos cafés com presidentes e todos os entes, esses, os negros, sentam poucos, ainda, nas mesas. O reflexo ou os ecos dessas constatações nos empurram para uma fala infindável de reparações que influenciam diretamente no transcrever de uma notícia. No olhar depositado sobre “uma verdade” e o pior, as disputas na base da pirâmide são manipuladas por nossas próprias carências. Especialistas apontam que o futuro do jornalismo será marcado pela integração de tecnologias como a inteligência artificial, que pode auxiliar na análise de dados e na personalização de conteúdo. No entanto, essa evolução deve ser equilibrada com a preservação do papel humano no jornalismo e esse humano ainda necessita reconhecer muitos papeis dentro de nossa área e isso não é apenas aparecer, como uma manobra capitalista.”
O que, segundo Eugênio Brito, jornalista já atuante em veículos como Placar, CNN Brasil, Uol e Estadão, pensa do jornalismo para o próximo ano.
A defesa constante de se aprimorar
“Em 2025 teremos consolidação de tendências já iniciadas e vistas neste 2024, sobretudo nesta reta final do ano. Falando da nossa questão, de pessoas pretas, de profissionais de comunicação, mas também de público receptor negro, de questões que nos afetam e nos fazem pensar aqui no Brasil, mas também de leituras globais, todos nós todos vivemos nesse planetinha azul, de uma forma geral vejo intensificação e também um maior entendimento sobre como podemos usar como ferramenta a Inteligência Artificial Generativa nas redações, no dia a dia do comunicador, sobre o quanto afeta o nosso papel como pessoas que estão tentando sobreviver através da Comunicação. Acredito que a gente vai ter uma adequação um pouco maior disso. Talvez um uso mais positivo, quero acreditar, menos aquela questão da interferência da IA, de que ela está lá para tirar emprego, mas tentar encarar como uma ferramenta que pode nos ajudar em termos mais positivos. Acredito muito nesse sentido de uso da IA que não tira a gente da Comunicação, pelo contrário, a gente continua fundamental na produção, a IA nos permite poupar tempo, para facilitar algumas tarefas e o cérebro continuar ativo, o cérebro humano continuar sendo o centro de tudo. E isso é fundamental para a gente porque a gente também está falando do Capitalismo também, desse lado que não dá para a gente ser ‘Poliana’ e ficar acreditando que tudo qualquer tecnologia está sendo construída apenas com um viés, claro que haverá pessoas que não estão nem aí com o humano, que só querem arrochar custos e ampliar lucros, pós-Elon Musk do mundo e do nosso país, nossas 4 ou 5 famílias que dominam a grande imprensa aqui no Brasil. Então temos de saber que ainda vai ter muito medo, muita questão do quanto somos relevantes, do quanto teremos ou não nossas vagas por aqui, mas por outro lado dá para tentar usar ferramentas em nosso benefício. E falando de veículos aqui, a expectativa é justamente dessa luta, que vai se intensificar. Vamos entrar no ciclo já de expectativa de eleições, já como ano anterior às eleições presidenciais, com muita derrubada de tapete, muita tentativa de intimidação. Ao mesmo tempo, os novos prefeitos ou os reeleitos, as Câmaras municipais assumindo, pessoas, no geral, infelizmente, muito conservadoras e pior, muito retrógradas, assumindo cargos. Como parte da Comunicação, da Imprensa, teremos de estar mais atentos, vigilantes aos nossos direitos, fazendo muito mais essas cobranças, fazendo mais a defesa do nosso povo. A gente já está vendo isso agora nesse final de semestre aqui no Brasil, sendo aprovada um monte de barbaridade, na União, mas também em Estados e Municípios, vamos ter que ficar muito mais juntos e em cima disso. E também de nos cuidarmos, nos protegermos, temos nível de agressões a jornalistas, inclusive aqui no Brasil, se ampliando, fora o quanto a gente sofre mentalmente, também vamos precisar estar muito mais de olho nisso. Por fim, recentemente, tivemos as primeiras noções de ações de controles de plataformas. Tudo isso vai reverberar, essas plataformas vão ter que se adaptar e quando você tira espaço, e eu acho correto proibir, realmente, para menores seja.para proteger a mente deles, mas também, protegê-los fisicamente, temos muita coisa ruim no virtual, que afeta o social e o pessoal. Com isso, talvez, sobre mais espaço e um espaço que pode ser ocupado pela Comunicação e por comunicadores, pela imprensa, isso é uma tendência que está sendo vista neste final de ano, em vários mercados. De novo, treinamento, cursos, atenção, dedicação – é um espaço bom para a gente se aproveitar, tem muita gente que ainda tem preconceito, aversão ao conteúdo mais curto, ao vídeo, mas é possível usar este espaço com relevância, sabedoria e propósito, com conteúdo bem pensado – é estudar o formato, porque estas plataformas vão precisar, vão querer. Se a gente correr o risco cada vez maior de perder espaço de um lado, de uma mídia mais tradicional e cada vez mais retrógrada, infelizmente, podemos e devemos buscar o espaço onde ele estiver e seguir comunicando.”
O que a ativista, comunicóloga e jornalista Sandra Chagas, do Movimento Cultural Afro e integrante da Red de Periodistas AfroLatinos.
O jornalismo como ferramenta de salvar vidas
“Estamos em um período do fim dos tempos, uma conscientização de mudança dentro dos corpos racializados está ocorrendo. Não somos mais indiferentes entre a vida e a morte de milhares de pessoas inocentes, só porque sim. Falo de uma negritude que me habita, cheia de racismo desde antes de eu nascer, porque eles foram e nós fomos as vítimas mais visíveis, as mais humilhadas e desumanizadas, eles nos tiraram as almas para nos escravizar e hoje é visível como um grande circo, que quem não tem alma são as pessoas que hoje continuam perpetuando e exercendo o racismo sistêmico, estrutural e institucional. Porque hoje a ONU, as Nações Unidas (não tão unidas) não podem impedir muitas mazelas, genocídio na Palestina, mas também não podem impedi-lo contra o povo da Nação Mapuche na Argentina e outros lugares e pessoas do mundo, incluindo nós. Um relatório revelou que mais de 192 jornalistas foram mortos até agora neste genocídio do século 21, e já sabemos que eles nunca mais retornarão para suas casas, lares com suas famílias. Milhares de órfãos de ambos os lados e se olharmos apenas para a Palestina e não para a África ou o Haiti, seria uma falta de respeito e humanidade para com a nossa própria negritude que tem sofrido a violação do estupro, do estupro, tanto de corpos como de seres humanos. Direitos tão desumanos para nós, desde o início do novo mundo.…’Não desvie o olhar’… diz um documento recentemente publicado pela Contrahegemonía Web. Ele não está à frente de seu tempo, vive em tempo real com o racismo colonial genocida e xenófobo de um sistema capitalista que já deveria entrar em colapso, por ir contra a ordem global espiritualidade e humanidade da vida com a natureza e que só continua a nos propor. Que em 2025 possamos dar luz e usar o jornalismo para amplificar lutas, vozes e usarmos a independência jornalística para ser uma luta contra o racismo e ao terricídio.
O que Dennis de Oliveira, professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, jornalista, ensaísta, escritor e doutor em Ciências da Comunicação, enxerga e espera sobre as tendências no próximo ano.
A consciência da caça do cliques e a frieza controladora para serem combatidas
“Enxergo que o jornalismo nas mídias hegemônicas vão priorizar a agenda do controle fiscal. Já há muito tempo que esta agenda se transformou no grande ‘mantra’ do jornalismo hegemônico que cada vez mais se transforma no porta voz dos interesses do capital rentista, até porque boa parte das empresas midiáticas estão umbilicalmente vinculadas ao capital rentista. Desta forma, com este paradigma central da agenda do controle fiscal, há uma relativização da agenda da ampliação e aprofundamento das politicas públicas (inclusive as de ação afirmativa) subordinando-as a tal necessidade do equilíbrio fiscal. Neste campo das políticas públicas percebe-se uma tendência a uma tecnicização do sentido de ‘eficiência’ da política pública bem como a restrição das demandas da agenda da diversidade ao aspecto denunciativo e criminal (atos explícitos de racismo em órgãos públicos e privados, cobrança de condenação de tais atos, etc). A cobertura das ações afirmativas como promotoras da inclusão tenderá a ser reduzida e mais ainda, uma tendência à condenação de um suposto identitarismo na esquerda. Além disto, o jornalismo hegemômico cada vez mais se submeterá as lógicas da busca dos cliques submetendo as técnicas jornalísticas de redação as estratégias de SEO e clickbait e a captação se transformando em curadoria de conteúdos publicados em redes sociais.”
E você, o que espera do jornalismo?
Diante das tendências, desejos e mudanças previstas fica a pergunta: *quais são suas expectativas e desejos como consumidor de notícias?* Seja no âmbito de mero receptor ou de feitor e receptor sendo um jornalista, que transformações você espera ver na forma como a informação é produzida, entregue e consumida?
Recentemente, produzimos uma matéria sobre o tema, que pode ser lida através deste link. (https://redejpcomunicacao.org/2024/10/17/tendencias-do-jornalismo-para-o-futuro-o-que-utilizar-e-aprimorar/). Ela, sem dúvida, ressoa o que o jornalismo já se alimentará nos próximos tempos e nos resta compreender como este impacto influenciará o nosso futuro.
Produtores e consumidores de conteúdo juntos, que influenciam essa comunicação, são a parte essencial desse processo. É hora de refletir e agir. O jornalismo do futuro se constrói agora – e com você.
Leave A Comment