(por Maria Eduarda)
O Ministério da Defesa criou o primeiro Observatório Nacional para monitorar a violência contra jornalistas. O órgão nasce como uma resposta ao pedido de entidades sindicais e de defesa da liberdade de imprensa para acompanhar ataques a jornalistas e restrição ao trabalho de profissionais e veículos de comunicação. O órgão deve realizar investigações e identificação de autores de crimes, além da construção de um banco de dados.
A primeira reunião do Observatório aconteceu em Brasília na última quarta-feira (8) e reuniu entidades de defesa da liberdade de imprensa e órgãos do poder judiciário. Após as resoluções do encontro, o órgão foi renomeado como Observatório Nacional da Violência contra Jornalistas e Comunicadores, uma forma de agregar todos os profissionais da área.
Durante a reunião foi entregue um dossiê com informações detalhadas sobre os 45 casos de ataques a jornalistas ocorridos entre os dias 8 e 11 de janeiro. Entre os episódios mencionados há casos de agressão física, humilhações, impedimento do exercício da profissão, bem como roubo de equipamentos e pertences dos profissionais.
Além disso, as organizações entregaram um documento com propostas para atuação do órgão. Nele são sinalizadas as atribuições e os tipos de violências para monitoramento. O observatório é composto por órgãos públicos, entidades jornalísticas e autoridades policiais e da justiça estadual e federal sob o comando do secretário nacional de justiça Augusto de Arruda Botelho.
Dados de violência contra jornalistas
O jornalismo e a liberdade de imprensa viveram sob forte ataque durante todo o mandato do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro. Os comunicadores brasileiros experimentaram anos de descrédito, ameaças e perseguição intensificados durante a pandemia. De 2019 a 2022, Bolsonaro realizou 570 ataques a veículos de comunicação e seus profissionais, uma média de 142,5 agressões por ano ou um ataque a cada dois dias e meio, de acordo com o Relatório anual de Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil da FENAJ.
Nesse mesmo período houve um aumento significativo de ataques cometidos por aliados e apoiadores do ex-presidente. Em 2022, eles foram responsáveis por 80 episódios de violência, 300% a mais que no ano anterior. Só em novembro, após as eleições, foram 53 ataques, na maioria deles, mais de um profissional foi atingido. Apesar de reconhecer que as agressões cresceram depois da posse presidencial em primeiro de janeiro, o relatório se restringe a dados de 2022.
De acordo com a pesquisa, a descredibilização da imprensa voltou a ser a violência mais frequente em 2022, ainda que tenha diminuído com relação a 2021. Foram 87 ataques com o intuito de desqualificar a informação jornalística contra 131 no ano anterior. Já com relação à ocorrência de ameaças, segunda categoria com maior número de episódios, houve um crescimento de 133,33%, totalizando 77 casos.
A censura que ocupou o primeiro lugar em 2021 aparece como a terceira colocada em números de ocorrência, uma diminuição de 54% que pode ser justificada pela queda no número de denúncias. As agressões verbais tiveram uma queda de 20,69%. No entanto, as agressões físicas tiveram um aumento de 88,46%, passando de 26 para 49 casos.
Também tiveram aumento os casos de impedimento de exercício profissional (200%) e ataques cibernéticos a veículos de comunicação (125%). Assim como nos três anos anteriores, Bolsonaro foi o principal agressor, sendo responsável por 80 episódios de descredibilização da imprensa, além de 10 agressões verbais e 14 hostilização, totalizando 24 agressões diretas a jornalistas.
Violência de gênero, ataques virtuais e de agentes estatais
Segundo o monitoramento realizado pela Abraji entre janeiro e abril de 2022, foram identificadas 151 agressões físicas ou verbais e outras formas de restringir o exercício da profissão como exposição de dados pessoais, restrições de acesso a informação, assédio sexual e uso abusivo do poder estatal.
Nesse mesmo período os ataques a jornalistas mulheres no Brasil, foram 7 casos de violência de gênero, contra 8 comunicadoras e ataques homofóbicos contra 1 comunicador. Os dados fazem parte de um projeto paralelo da Abraji que monitora ataques relacionados a violência de genero, sexualidade, orientação sexual contra comunicadores de forma geral, além de casos de agressões contra jornalistas mulheres cis ou trans.
“Como jornalista e integrante da comissão de ética do sindicato, acredito que os ataques sofridos aumentaram e no que diz respeito a população negra que já sofre com micro agressões diárias o profissional, principalmente mulher, acaba sendo vítima de mais violência”, afirma Marcelle Chagas.
Segundo a jornalista, os ataques contabilizados pela Federação Nacional de Jornalistas já eram observados. “Nós enquanto jornalistas e mulheres já observamos há muitos anos o impacto maior [dessas agressões] em mulheres negras”, explica.
Além disso, dados do monitoramento evidenciam a participação de agentes públicos nos ataques, 70,2% contaram com a participação de atores do Estado e 57,6% de indivíduos que cumpriam mandatos em cargos eletivos. Dos 106 ataques 70 (66%) envolveram a família Bolsonaro.
Outro dado importante diz respeito às plataformas digitais. Segundo o estudo, o ambiente virtual é terreno hostil para comunicadores brasileiros já que 62,9% das agressões registradas até abril de 2022 tiveram origem ou repercussão na internet.
O registro de dois assassinatos de profissionais de imprensa nos primeiros sete meses do ano reforçam 2022 como o ano mais violento para o jornalismo brasileiro.
Para acessar o relatório completo clique aqui.
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