Marcelle Chagas
O metaverso tem reconfigurado as relações entre o mundo virtual e o físico e já é possível acompanhar o mercado se adaptando a novidade com o surgimento de diferentes ações, como a criação de workrooms – espaços on-lines para realização de reuniões -, e com representações virtuais de seres humanos através de avatares. Para o jornalismo não é diferente, já estão sendo pensadas estratégias para tirar proveito desta nova forma de socialização e o seu impacto. De acordo com o coordenador de mídia e racismo da CLACSO (Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales), Elbert Agostinho, o mundo digital pode proporcionar uma ênfase na diversidade que há no mundo.
“As conexões permitem novos olhares sobre a existência humana. Donna Haraway (2009), propõe em sua obra Manifesto Ciborgue, que “somos todos quimeras”, seres fabricados por uma série de construções identitárias, eis que o metaverso é também esse mosaico de fragmentacões. Onde a possibilidade de descolonização do imaginário é possível. Nesse sentido, podemos utilizar o metaverso para compor novas histórias e exibir histórias ancestrais do povo negro.” -Ressalta o especialista.
Com a crise do jornalismo aprofundada pelo aumento no uso das redes sociais e da internet, que possibilitou o acesso mais rápido de novos fatos e notícias, e agravada pela disseminação de notícias falsas, os grandes veículos de informação buscam soluções para resgatar a conexão com a população e a credibilidade através da Realidade Virtual com o jornalismo imersivo. Ainda pouco utilizado no Brasil, veículos como The New York times já investem na tecnologia apostando em “expandir seu jornalismo para que o leitor possa vivenciá-lo em três dimensões, apenas pegando o seu telefone.”
Uma nova forma de fazer jornalismo
Sendo apenas 20% nas principais redações do Brasil segundo a pesquisa realizada pelo Geema/Uerj em parceria com a Rede JP) os jornalistas negros, indígenas e periféricos buscam cada vez mais espaços para imprimir suas narrativas dentro do processo que é um dos pilares da sociedade, seja ela virtual ou física. Apesar de ser visto como um campo de novas oportunidades, o metaverso também se estabelece como um campo de disputas que deve ser levado em consideração. “Se o metaverso é originário de nossa sociedade, devemos levar em conta que o racismo também vai viajar pela realidade alternativa, logo, se desenvolvemos ações antirracistas em nosso universo, podemos destruir o racismo no metaverso também.” , ressalta Elbert Agostinho.
Durante o “Metaverse Culture Series: Black future discussions “, evento promovido pela Meta nos Estados Unidos, comunicadores negros discutiram a importância de se ter uma identificação visual que represente a diáspora africana, a relevância de se colocar pessoas negras em espaços de poder para influenciar quais histórias serão contadas na sociedade e a acessibilidade da tecnologia para populações em vulnerabilidade.
Sandra Martins é jornalista formada pela Universidade Facha desde 1985 tendo passagens por veículos como o Jornal do Comércio, em que atuou como diagramadora, Folha dirigida e outros veículos dentro do jornalismo. Para a profissional, o Metaverso vai aprofundar a desigualdade existente no Brasil.” “Os avanços tecnológicos não contemplam toda a sociedade, notadamente as populações de baixa renda mantidas como farta mão de obra desqualificada e barata. Entretanto, o ponto positivo é que os limites da excludência são transgredidos constantemente. E, para isso, torna-se vital que haja conscientização racial e sobre tais mecanismos excludentes para que nos fortaleçamos e corramos na frente para nos mantermos qualificados para atuar no campo virtual e concreto visando a destruição dos heterogêneos discursos de ódio.”
Para Diego Oliveira, Consultor e especialista em Consumer & Media Insights e CEO da Youpper Consumer & Media Insights, toda tecnologia que é inserida na sociedade modifica o modo de fazer do jornalismo.” Vimos isso com o telefone, o rádio, a televisão, a internet e as redes sociais. Baseado nisso, afirmo que sim, a forma de consumir informação será, não digo alterada, mas sim implementada com o Metaverso. Assim também ocorrerá com a forma de produzir informação para consumo da população. Como é tudo ainda muito novo, não há como mensurar de forma exata como e quando ocorrerão essas implementações, mas adianto que o “plus” trará muito mais interatividade, dinamicidade e participação ativa do que já vivenciamos nesta era das redes sociais.”, ressalta Diego.
Ainda de acordo com o profissional, o primeiro desafio legal é a falta de leis no Metaverso. Por não possuir um Marco Legal, esse mundo digital vira o que chamamos de “terra sem lei” e isso pode ser um impulsionador para as pessoas destilarem violências racistas. “Outro desafio é que há a criação de perfis e avatares fakes no Metaverso, o que dificulta o rastreamento da pessoa, que está no mundo concreto, que está por trás daquela tecnologia cometendo atos racistas. Também temos o desafio da propagação da informação. Assim como no mundo concreto, as informações são divulgadas e repassadas no Metaverso. Mas como estamos falando de um mundo digital, o saber a origem da informação, no caso da violência racista, será muito mais difícil. “, reforça o mestre em comunicação.
O especialista ainda destaca que nem tudo está perdido: podemos fazer do Metaverso uma realidade saudável, com mais oportunidades e acessos à população preta. Mas as ações para isso ocorrer precisam partir do mundo concreto, como leis que podem ser aplicadas no mundo digital, rastreamento dos avatares e a educação antirracista que pode ser proporcionada nos dois mundos. O que não podemos permitir, como pessoas com consciência racial, é que as violências contra o povo preto continuem ocorrendo, tampouco permitindo e mantendo, mesmo que indiretamente, a desigualdade econômica e de oportunidades para essas pessoas.
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